Além da dor severa, o que a enxaqueca causa no cérebro?

A enxaqueca é reconhecida mundialmente como uma das condições mais incapacitantes existentes. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), ela figura entre as doenças que mais impactam a qualidade de vida e a produtividade laboral.

Quem convive com a enxaqueca compreende que não se trata “apenas de uma dor de cabeça”. Durante uma crise, habilidades cognitivas e motoras básicas ficam comprometidas. Ações rotineiras como dirigir, trabalhar em frente a telas ou manter uma conversa tornam-se desafios Hercúleos devido à hipersensibilidade sensorial. Mas por que uma condição tão prevalente, afetando milhões de brasileiros, continua sendo subestimada e, muitas vezes, subtratada?

Neste artigo, a equipe da Clínica Dr. Hong Jin Pai explora a fisiopatologia da enxaqueca — o que ocorre neurologicamente antes e durante a dor — e apresenta abordagens terapêuticas modernas, desde a farmacologia avançada até a reabilitação física.

A enxaqueca é uma doença neurológica crônica, de base genética, caracterizada por um cérebro hiperexcitável. Diferente de uma cefaleia tensional comum, a enxaqueca envolve uma cascata de eventos neuroquímicos e inflamatórios.

O paciente enxaquecoso possui um limiar de dor reduzido e uma dificuldade biológica em filtrar estímulos sensoriais (luz, som, cheiro). Uma crise típica pode durar de 4 a 72 horas se não tratada adequadamente, variando de intensidade moderada a severa, frequentemente unilateral e pulsátil.

Gatilhos e Causas

É importante diferenciar causa de gatilho. A causa é biológica e genética (predisposição). Os gatilhos são fatores ambientais ou internos que “disparam” a crise em quem já tem a doença. Identificar seus gatilhos pessoais é o primeiro passo para o controle.

Os principais desencadeantes incluem:

• Estresse e Emoções: Tanto o pico de estresse quanto o relaxamento repentino após um período estressante (o efeito “cefaléia de fim de semana”).
• Jejum Prolongado: A oscilação da glicose é um gatilho potente. Pular refeições é contraindicado.
• Sono Irregular: Dormir pouco ou dormir muito além do habitual altera o ritmo circadiano e favorece crises.
• Fatores Hormonais: A queda de estrogênio no período menstrual é a principal responsável pela enxaqueca em mulheres.
• Alimentação: Alimentos ricos em tiramina (queijos curados), nitratos (embutidos), álcool (vinho tinto) e excesso ou abstinência de cafeína.

Leia mais sobre os 11 principais gatilhos para enxaqueca neste artigo detalhado.

Para entender a fisiopatologia da enxaqueca, precisamos olhar para o Sistema Trigeminovascular. O nervo trigêmeo é o principal responsável pela sensibilidade da cabeça e face.

Em um cérebro predisposto geneticamente, os gatilhos ativam uma onda de despolarização elétrica que se espalha pelo córtex (Depressão Alastrante Cortical). Isso ativa o sistema trigeminal, fazendo com que ele libere substâncias inflamatórias (neuropeptídeos) nos vasos sanguíneos que revestem o cérebro (meninges).

O resultado é uma inflamação estéril (neurogênica) e a dilatação desses vasos. O cérebro interpreta essa inflamação e pulsação dos vasos como dor intensa. Ou seja, a dor da enxaqueca é o resultado de uma “falsa” sinalização de perigo gerada por um sistema nervoso hipersensível.

O Perigo da Cronificação

Se as crises não forem tratadas corretamente ou se o paciente abusar de analgésicos comuns, o cérebro “aprende” a sentir dor. Esse processo é chamado de sensibilização central.

Isso leva à enxaqueca crônica (dor em mais de 15 dias por mês), tornando o tratamento mais desafiador. Por isso, a intervenção precoce com um especialista em dor é vital.

Tratamento Médico Especializado

O tratamento da enxaqueca divide-se em dois pilares: abortivo (para parar a dor na hora) e preventivo (para evitar que a dor venha).

1. Tratamento da Crise (Abortivo)

O objetivo é cessar a dor em até 2 horas. Usamos analgésicos simples e anti-inflamatórios, mas principalmente medicamentos específicos como os Triptanos (ex: sumatriptano, rizatriptano). Eles agem contraindo os vasos dilatados e inibindo a liberação de substâncias inflamatórias.

2. Tratamento Preventivo (Profilático)

Indicado para quem tem crises frequentes ou muito incapacitantes. O objetivo é reduzir a frequência e intensidade das dores.

• Orais Tradicionais: Antidepressivos tricíclicos, betabloqueadores e anticonvulsivantes que modulam a excitabilidade cerebral.
• Toxina Botulínica (Botox): Padrão ouro para enxaqueca crônica. As aplicações bloqueiam o transporte de sinais de dor nas terminações nervosas da cabeça e pescoço.
• Anticorpos Monoclonais (Anti-CGRP): A revolução no tratamento. São injeções mensais (como erenumabe, galcanezumabe) que agem como uma “vacina”, bloqueando especificamente a molécula CGRP que causa a inflamação da enxaqueca, com poucos efeitos colaterais.

Além da farmacologia, a medicina integrativa desempenha papel fundamental na redução da excitabilidade cerebral. Estudos clínicos comprovam a eficácia da Acupuntura Médica na profilaxia da enxaqueca, atuando na liberação de endorfinas e modulação da dor.

A fisioterapia também é essencial, especialmente quando há dores cervicais associadas ou Disfunção de ATM, utilizando técnicas de terapia manual, exercícios de estabilização e RPG para corrigir fatores biomecânicos que pioram a dor de cabeça.

Se você sofre com dores frequentes e sente que os remédios comuns já não fazem efeito, procure ajuda especializada. Na Clínica Dr. Hong Jin Pai, oferecemos um olhar humano e técnico para devolver sua qualidade de vida.